Ana Rita Carvalho: Do desporto às terapias, as dimensões do bem-estar holístico
As distinções que conquistou são apenas uma parte da história de Ana Rita Carvalho. Nesta entrevista, a terapeuta revela-nos que um percurso se constrói com trabalho, dedicação, investimento, mas acima de tudo alicerçado em relações interpessoais que se vão criando ao longo da vida. Um testemunho inspirador sobre sucesso e a importância de um bem-estar holístico.
Perfil
Natural de Vidago, licenciou-se em Ciências de Desporto, na UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro) e posteriormente fez um mestrado com especialização em actividade de academia e, um ano depois, concluiu uma pós-graduação em fisiologia do exercício. Não fazia parte dos planos de Ana Rita dedicar-se às terapias, mas, acabou por ser conquistada quando começou a trabalhar nesta área profissional, ainda estudante, para financiar a sua formação. E quis o destino que o primeiro local de trabalho fosse, “afortunadamente”, o Vidago Palace Hotel. Na altura com 18 anos, passou pela recepção do Spa e após terminar a licenciatura e mestrado foi personal trainee. Após seis meses como responsável pela parte do exercício físico, foi-lhe feita uma proposta para “experimentar” a área das terapias que só aceitou depois de fazer um curso em Terapias Manuais no Instituto Português de Naturologia no Porto. Ao fim de dois anos surgiu-lhe uma nova proposta, desta vez para fazer a abertura do Spa do hotel Maison Albar – Le Monumental Palace, no Porto. Quando aceitou tinha pela frente um duplo desafio, um novo local de trabalho e mudar toda a sua vida para o Porto, sozinha. Uma decisão que viria a ser determinante no seu percurso “porque me permitiu abrir horizontes e conhecer pessoas que me ajudaram a olhar para esta área de uma forma muito mais intensa e apaixonada”. Após um ano e meio muda-se para o Boeira Garden, em Gaia que acabou por encerrar durante a pandemia. Candidatou-se a uma vaga de terapeuta no Vinha Boutique Hotel e após um ano recebeu uma proposta do Six Senses Douro Valley onde esteve durante dois anos e meio. Foi como terapeuta do Six Senses que conquistou o 1º lugar geral no campeonato ibérico de Massagem, e o 1º lugar em massagem desportiva. Recentemente, abraçou um novo projecto do grupo Torel, como Spa Manager do Calla Silent Spa – Torel Quinta da Vacaria.
“Tudo aconteceu um pouco por acaso, e cheguei até aqui com alguma sorte e por me ter cruzado com pessoas que acreditaram e me incentivaram a ser melhor e a querer mais.” “Existe uma abertura cada vez maior à massagem como bem essencial e não apenas como luxo.”
Que características são na sua perspectiva, essenciais para o bom desempenho de uma massagista tanto em termos de habilitações/qualificações técnicas, quanto interpessoais?
Creio que é de suma importância ter conhecimentos em anatomia, primordialmente. Tendo esse conhecimento, tudo o resto se pode agregar, porque o básico já existe. Depois disto, investir em formações diversificadas, porque o mundo das terapias é muito vasto, assim como as exigências dos clientes. Por outro lado, quando se é terapeuta, as relações com os outros são importantíssimas. Isto porque trabalhamos para pessoas e, na maior parte das vezes, com pessoas. E, acredite-se ou não, as energias existem e um/a terapeuta convive diariamente com elas. Por isso, na minha opinião, sermos capazes de construir relações boas e saudáveis com as pessoas que tratamos e, sobretudo, com as pessoas que trabalhamos, é fundamental.
De que forma a sua formação académica influenciou o seu percurso profissional e contribuiu para a conquista de vários prémios e distinções?
Acredito que o facto de ter estudado muito a área da saúde no contexto do exercício físico, me ajudou a ter uma visão muito mais específica e detalhada sobre as áreas a tratar. Saber o quê, onde, como e porquê, permitiu-me construir o meu estilo de massagem e, consequentemente, ser diferente na forma como abordo e aplico as técnicas.
O que representam para si as distinções que já alcançou?
Representam, sobretudo, o trabalho. Sempre encarei a minha evolução profissional de uma forma muito leve e optimista, mas com bastante rigor e ousadia. Os prémios alcançados foram apenas o reflexo dos 11 anos que passei dentro de uma sala de tratamentos, vendo os meus colegas, aprendendo com quem eu sabia que tinha o conhecimento, e aplicando. Sobretudo, arrisco-me a dizer que foi a rebeldia e o trabalho que me trouxeram até aqui.
E que papel tiveram na sua progressão profissional, em particular no recente desafio que abraçou enquanto spa manager do Torel Quinta da Vacaria?
Este prémio não veio a ser o diferencial nessa progressão. Contribuiu, até certo ponto, como reforço, apenas. Como referi anteriormente, e dando algum ênfase a esta parte, as relações interpessoais aliadas à dedicação diária no local de trabalho, sendo exigentes e exímios naquilo que fazemos, mais tarde ou mais cedo dará frutos.
Como é que está a ser a experiência enquanto SPA manager? E quais são os maiores desafios ?
Chegar até esta função foi, a determinado momento, algo que quis. No sentido da progressão profissional, mas também como forma de poder contribuir com a minha experiência para o mundo do bem-estar. Seja a nível de liderança de equipas, seja na implementação de novos conceitos. Creio que o maior desafio é aquilo que, também, me dá mais regozijo: liderar as pessoas com quem trabalho. Vê-las crescer, desafiaram-se, evoluírem e estarem contentes no local de trabalho, é algo desafiante, mas também é algo que nos retribui de uma forma muito bonita.
Na sua perspectiva que tipo de massagens registam mais procura actualmente? E que benefícios têm associados?
Arrisco-me a dizer que, ano após ano, a tendência não tem mudado muito: continuamos a ter pessoas que procuram massagens para fins terapêuticos (massagem desportiva, deep tissue, massagem terapêutica), e muita gente à procura de relaxamento, apenas. O que eu reparo é que existe uma abertura cada vez maior à massagem como bem essencial e não apenas como luxo. Dada a velocidade dos tempos modernos, ou hipermodernos, que vivemos actualmente, ter uma hora para cuidar de nós é visto como essencial e inegociável.
E como adapta as suas técnicas de massagem para responder às necessidades especificas dos clientes?
Cada pessoa é um ser individual, e as técnicas vão variando tendo isto em mente. Faço questão de personalizar o tratamento de acordo com as necessidades de cada cliente. Creio que ouvir é fundamental para que o tratamento seja irrepreensível.
E quais são os seus maiores aliados?
A esta pergunta vou responder de forma muito precisa e concisa: mãos, cabeça e coração.
De que forma os locais onde trabalhou e trabalha influenciaram a sua visão e abordagem ao bem-estar/ wellness ?
Foi graças aos sítios por onde tive a sorte de passar que cheguei até aqui e até à forma como encaro o mundo do bem-estar. Cada um à sua maneira, contribui de forma muito positiva para que não perdesse o encanto pela área.
O Vidago Palace Hotel foi onde tudo começou e, nessa época, a visão era muito voltada para o bem-estar através da água, que de resto se enquadra bastante na génesis dos spas. Tive a sorte de ter começado com as bases certas, e num local onde a água é terapêutica por si só.
No Monumental, o conceito de bem-estar estava alicerçado no luxo e no requinte dos espaços, pela beleza dos materiais e da qualidade dos produtos.
No Hilton (Boeira), aprendi contextualizada num conceito de bem-estar muito mais internacional, muito bem estruturado e segmentado. No Vinha Hotel, voltei a trabalhar com o luxo aliado ao bem-estar, ao serviço calmo e tranquilo mas atento e com uma margem de erro mínima.
Finalmente, no Six Senses, encontrei uma marca internacional pioneira em Wellness, muito forte na sua filosofia, na sua implementação e abordagem. Não exagero se disser que, no que toca a know-how, o Six Senses é uma escola, ou “a escola”.
Que dimensão ganhou actualmente o conceito de wellness na vida das pessoas? E de que forma está a influenciar estilos de vida?
Na minha opinião, as pessoas estão cada vez mais conscientes no que toca à saúde e bem-estar. O descanso sempre foi um dos pilares do bem-estar, mas, só recentemente, é que voltou a ser tema dominante. Há anos que existe uma preocupação com o corpo (exercício físico, alimentação), mas a nossa mente e cérebro foram ficando sempre para depois. Não sei se diria felizmente ou infelizmente, mas actualmente, já se nota uma preocupação cada vez maior em relação ao sono, à saúde mental, e ao “desligar do botão”.
Juntando estes dois pilares do bem-estar, creio que o mundo do wellness tem vindo a ganhar uma maior dimensão e é cada vez mais importante no dia-a-dia das pessoas. Ou, pelo menos, as pessoas sabem qual é a direcção.
E de que forma a massagem contribui para a promoção da saúde mental, emocional e física neste contexto de wellness?
Quando as pessoas encontram uma hora na agenda atarefada para fazer uma massagem e, de facto, a marcam e realizam, sentem-se como novas. Seja porque conseguiram desligar durante esses minutos, seja porque o stress foi aliviado, ou porque a/o terapeuta conseguiu tratar as zonas de maior tensão, toda a gente sai da sala de tratamentos com um semblante mais relaxado e, sempre, com a promessa de que “vou fazer isto mais vezes”, risos.
Tem um estilo próprio de massagem? Se sim, faz questão de o replicar na sua equipa?
Sim, a minha forma de trabalhar a massagem é muito própria. As técnicas que uso não são nada para além daquilo que quase todo/a o/a terapeuta faz, mas a sua aplicação pode variar e ser o diferencial.
Tento que a minha equipa se sinta livre de personalizar os tratamentos, tendo apenas em conta alguns factores que, para mim, são inegociáveis durante uma massagem, sempre na óptica do bem-estar e conforto dos clientes. Feita esta parte, dou algumas linhas orientadoras, alguns inputs caso ache necessário, mas não sou muito a favor de protocolar as terapias.
Para oferecer uma experiência mais imersiva, quais são para si as condições ideais num espaço?
O aroma, num spa, é essencial e deverá ser relaxante e convidativo. A iluminação, a meu ver, deverá ser o mais natural possível, não sou apreciadora de Spas escuros, até porque a luz natural traz benefícios incalculáveis. A música, é um factor importantíssimo, mesmo que num registo ténue. Um spa, sem música, não é um spa. Dentro da sala, a qualidade das marquesas tem de ser óptima, quer para o cliente, quer para o/a terapeuta. No que toca a decoração, aprecio um estilo mais minimalista: pouca coisa, no sítio certo.
Como é que essas características se materializam no spa do Torel Quinta da Vacaria?
Na Quinta da Vacaria, vão encontrar um spa com um circuito de águas (piscina interior, sauna, banho turco, duches sensoriais e área de relaxamento) com uma vista deslumbrante para o rio Douro. A entrada de luz natural é um dos nossos pontos fortes. Quando se entra na recepção do Spa, o aroma a laranja doce é notório (o óleo essencial de laranja doce é considerado o aroma da alegria), a música clássica relaxante está presente em todas as secções, e a decoração foi feita pela Joana Astolfi, que por si só, dispensa apresentações. Os materiais (marquesas) são exímias no conforto e são reguláveis em altura e temperatura. Qualquer material que se encontra dentro do Spa é de elevada qualidade e beleza.
O que podemos esperar no futuro da Ana Rita Carvalho? Que outros títulos gostaria de alcançar? Ou em que campeonatos gostaria de participar?
Creio que, no que toca a campeonatos, estarei parada durante um tempo. Neste momento, o meu foco está em crescer como profissional, como líder e como mentora. Gostaria muito de ensinar a nova geração e poder contribuir de forma positiva para que a nossa área ganhe mais projecção e consideração no nosso país.